moradia contemporânea com elementos tradicionais de uma arquitectura classizante
As edições de "A Arquitectura Popular em Portugal", iniciativa do então Sindicato Nacional de Arquitectos, dividem-se tematicamente pelas várias províncias do país. Equipas de arquitectos se organizaram-se para uma inventariação e estudo do património nos anos 50. Esta obra apresenta-se cada vez mais como uma obra ímpar de valor inestimável a uma boa preservação e valorização do património arquitectónico de cariz mais rural, popular. Depois de uma deturpação daquilo que se julgava ser uma arquitectura tradicional, divulgada nos primeiros anos do Estado Novo e sobretudo através dos manifestos do arquitecto Raul Lino como resistência à entrada no país dos ideais modernos já consolidados pela Europa.
O volume que diz respeito ao estudo do Minho e Douro Litoral é coordenado pelo arquitecto Fernando Távora. A ideia era procurar as verdadeiras raízes de uma arquitectura popular tipicamente portuguesa para a construção de uma arquitectura moderna fundamentada nos seus elementos mais ancestrais.
Este inventário é tão mais importante quando foi realizado imediatamente antes das grandes transformações que se processaram no território no pós-25 de Abril. Os registos fotográficos e a análise das várias tipologias são essenciais para uma recuperação cuidada.
Um conjunto de fenómenos onde se contava também um desejo de apagar da memória todas as marcas de pobreza e atraso fez com que no espaço de 20 anos grande parte dessa arquitectura profundamente enraizada no nosso mundo rural fosse derrubada. Sobretudo na década de oitenta e noventa do século passado, diversas casas rurais foram restauradas com ampliações no sentido de as prepararem às condições de conforto e higiene dos tempos modernos. A antiga casa de pedra era constituída por uma ou duas salas que serviam simultaneamente de sala/cozinha/quarto. Foi uso corrente a ampliação destas casas com um novo segundo piso que derrubava com as características tipológicas da original. Outro fenómeno foi o da chamada "casa de emigrante" onde projectos descontextualizados e incoerentes com a nossa arquitectura implantam-se no espaço rural. No entanto, estas chamadas "casas de emigrante" são de certo modo menos gravosas para o património porque são normalmente construídas de raiz em terreno próprio não destruindo normalmente as velhas casas da aldeia. Assistimos também a situações em que estas habitações rurais mantiverem alguns dos seus traços originais mas foram alvo de ampliações imitando com pequenos tiques o corpo original da casa e instalando a confusão entre o real e o postiço. Janelas e portas alargadas para poder albergar mais um carro são alguns dos exemplos.
Nos anos 90 até a actualidade assistimos a um outro fenómeno onde construímos habitações que nos remetem para as antigas casas solarengas dos séculos XVIII e XIX. São moradias com um desenho baseado em elementos caricaturados dos antigos solares: a varanda colunada, as cantarias nas janelas, os pináculos nas esquinas do telhado, a torre e a escadaria de entrada. Porém , escondem na sua construção as mais modernas tecnologias com a predominância do betão e tijolo. O seu interior satisfaz as exigências de conforto da vida contemporânea com todos os luxos inerentes. Utilizando uma metáfora de gosto automobilístico podemos assumir que os proprietários pretendem um Chevrolet de 1937 com motor Ferrari de 2007, ar condicionado e airbag.
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