quarta-feira, 17 de junho de 2009

Património


Na última semana foi inaugurado o monumento evocativo da Lenda do Rio Lethes- Rio do Esquecimento nas margens do Rio Lima em pleno centro histórico. É uma obra "malfadada" desde os primeiros movimentos de terra no areal que faziam adivinhar a sua inusitada implantação em local historicamente reservado à inconstância das águas. Um grave erro facilmente perceptível neste primeiro passo da obra. O segundo passo materializado na colocação da estatuária fez jus às piores expectativas. O tradicional enquadramento paisagístico da ponte medieval e casario com o seu ar bucólico sofre um duro golpe com este "ruído" naquele imenso vazio do areal. É certo que esta lenda já estava, e muito bem, representada num painel de azulejos em espaço nobre (numa das esquinas do Mercado Municipal), baseado numa bela tapeçaria de Almada Negreiros presente num Hotel de Viana. Desta forma, este novo monumento apenas pretende recalcar e reivindicar a lenda para o actual local. Esta insólita intervenção no areal , pousando uma base de betão para acolher arte figurativa abre um precedente grave neste espaço eminentemente moldado pela natureza justificando acções futuras. Por outro lado, o facto de não estar inserido num plano mais abrangente de requalificação do areal condicionará a longo prazo esta mesma proposta. Em declarações ao Jornal Alto Minho o presidente da autarquia afirmou que este monumento pretende mostrar que Ponte de Lima é também uma vila românica (existiam dúvidas?) e que estas imagens "coloridas" irão espalhar Ponte de Lima pelo mundo (é este o postal que queremos transmitir?). As intervenções sem o devido aconselhamento e baseadas no gosto popular correm o risco de infantilizar uma ideia nobre e sobretudo não terem a capacidade de resistir ao teste do tempo. O ambicioso Plano de Valorização das Margens do Lima; um projecto meritório que marcou o início da presidência de Daniel Campelo na Câmara Municipal e que de uma forma correcta e saudável colocou os limianos a discutir uma orientação a longo prazo para o centro histórico parece pertencer ao passado. A realidade é que muito do proposto nesse plano foi construído e Ponte de Lima beneficiou de intervenções desapaixonadas mas simultaneamente sensíveis à paisagem e estrutura urbana da vila. Refiro-me a obras como o centro náutico, pousada de juventude, Festival de Jardins, mercado do gado e mercado municipal assim como o novo posto de turismo que, embora sub-aproveitados e controversos, foram amplamente divulgados fora do país em publicações da especialidade que potenciaram um novo turismo apreciador de arquitectura contemporânea e de novas abordagens ao património em centros históricos. Atitude corajosa por parte do município que não enveredou pelo caminho mais cómodo da mediocridade. No entanto, as últimas intervenções no espaço urbano, apesar de rápidas, denotam claramente a pobreza de discussão pública e sobretudo um esquecimento de saberes disciplinares de urbanistas, designers, arquitectos e escultores devidamente qualificados e que em parceria deveriam ser os actores de um palco sensível como é o centro histórico de Ponte de Lima. A dura realidade é que o turista culto sabe distinguir o património real do património postiço.

17 comentários:

Anónimo disse...

postiço? kitsch? irreflectido?sentido compositivo muito questinonavel e uma sinestesia cromática capaz de dar náuseas...muito ruido
As figuras parecem vindas de uma feira popular e não dignificam em nada a lenda do "lethes". Promovam concursos de ideias e coloquem quem de valor a intervir no espaço, nao sejam os próprios politicos a desenhar a urbe.Descentralizem o território de Ponte de Lima do plano de Salvaguarda do centro histórico. Quer-se contemporaneidade e espaços verdes nos novos loteamentos, e, na arte de fazer urbanismo. Não esgotar índices de afectação do solo como se tem assistido na expansão da coroa das vila. É preciso parar para pensar no mau modelo de crescimento de Ponte de Lima e começar a tomar medidas atempadamente,antes que o "ruido" seja factor dominante.

Anónimo disse...

É o habitual desnorte antes das eleições, o que é preciso é inaugurações !

Rotundas, xafarizes, estatuaria de mau gosto, enfim ...

Como diziam os romanos, o que é preciso é dar circo ao Povo

Anónimo disse...

É só impressão minha ou aquelas "estátuas" parecem matraquilhos...?

Anónimo disse...

Excelente texto André...

E apoio totalmente o primeiro comentário...

Já comentei os outros blogues sobre este assunto... e não o quero fazer mais... Fartei.

Abraços

Monalisa disse...

Não posso acreditar...

Anónimo disse...

Parecem mesmo matraquilhos.
Esta foi definitivamente uma espingardada nos pés.

Espero, mas não acredito, que removam esses matraquilhos dentro de pouco tempo.

Entretanto não és o único a lutar pela tua terra.
Outros o fazem mas no meio do oceano

http://capomundo.blogspot.com/

CAPOMUNDO BLOGSPOT COM

Pedro P. Marinho disse...

A sua análise do nosso extenso areal frente à vila deveria ser lida (como lição) pelo vereador do ambiente.Mas já vale tudo .Li no jornal AM uma denuncia- com foto - do Movimento Para a Defesa do Rio Lima que o entulho , das obras recentes nas artérias da vila , está a ser lançado para as margens do Rio Lima . Perderam a vergonha !

Pedro P. Marinho

António Morais disse...

Na minha opinião, o presidente Campelo - na politica de defesa ambiental e paisagistica - do Rio Lima falhou completamente !


António Morais

C.A. disse...

Ontem entrei a gozar umas férias .Esteve sentado numa esplanada do Passeio 25 de Abril , ao fim da tarde , o pó levantado pela entrada e saída dos automóveis no espaço do areal -não dava para acreditar ! Fico triste pela minha terra .

C.A.

Luís Queiroz disse...

O que mais nos espanta, como é possivel deixar em tamanho abandono um dos lugares mais belos de Ponte de Lima . Que vai da Alameda de São João até a Avenida dos Plátanos . Todo aquele espaço ribeirinho é fabuloso . Porquê tanta falta de vontade . Não se consegue entender !

Luís Queiroz

Carlos Santos disse...

Completamente de acordo com o último comentário . Aquele espaço salta aos olhos . Luz , água ,montes . Um lugar único em qualquer parte do mundo . Mesmo degradado como está ainda nos cativa !
O seu blog é um excelente espaço de comunicação maior .

Carlos Santos

Nasci Maria disse...

Bem eu estava curiosa para cá vir ver o teu comentário que tinha a certeza, vir de encontro ao que escreveste.

Sem dúvida que este povo permissivo nem sequer reclama sobre isto! Espero que o rio cumpra o seu dever e no inverno leve Rio abaixo aquela bonecada toda e nos faça esquecer esta lamentável falta de bom gosto e sentido estético que temos vindo a ver acontecer em Ponte de Lima nos últimos tempos.

Rosa Costa disse...

A frase é admirável ' aquela bonecada toda pelo rio abixo!'
Esta cegueira cultural é de meter medo ao mais corajoso .

Rosa Costa

Carlos Coutinho disse...

ALFF fala-nos de uma triste realidade: da nossa apatia como povo ,como comunidade. Poucas vozes
se levantaram contra aquela barbaridade ! Sinais dos tempos !


Carlos Coutinho

Vítor disse...

É levar a "bonecada" para o Portugal dos Pequenitos.

Mas têm de os levar até lá, pq ninguém de juízo os vem cá buscar!

MST disse...

Cada dia que passa é mais grave a situação .O pó levantado pelos automóveis , aquilo já não é areal , mas terra degradada , afasta as pessoas. Aquele espaço ribeirinho e que ainda há poucos anos era local marcante da nossa vila ,deixa-nos hoje uma grande tristeza. Pior: As pessoas a jantar nas esplanadas com aquele pó - é um atentado à saude !
MST

Amândio S.Dantas disse...

Hoje já é possivel afirmar , com toda a clareza, que o maior fracasso do engenheiro Daniel Campelo , seus consecutivos mandatos , como presidente da Câmara Municipal de Ponte de Lima , foi ter consentido a ocupação desenfreada pelo automóvel , das margens do rio lima
(frente ribeirinha ). Um desastre ecologico que se vai pagar muito caro...

Amândio S. Dantas